Érica completa 100 de vida e saúde em Porto Alegre
Cheia de sorrisos, olhos dinâmicos e brilhosos, a centenária Érika Emília Caetani mora sozinha em um confortável apartamento do terceiro andar de um prédio sem elevador. Limpa a casa sozinha – inclusive subindo na mesa para tirar o pó de um lustre que a faxineira não dá conta como ela gostaria -, passeia pela cidade, viaja para ver seus filhos, costura, e ainda, mesmo que com “a vista fraca”, faz seus crochês.
Hoje, Emília completa 100 anos de idade em um encontro na casa de um dos dois filhos, que lhe deram 6 netos e 8 bisnetos. “Nem imaginava chegar até aqui”, comenta, sempre rindo, e dá uma dica de vida: “minha mãe sempre dizia: Incomodação é o que mata”, honrando a memória do marido, vítima de câncer de pulmão aos 66 anos. “Um bom namorado, um bom pai, e um bom marido. Uma falta”.
Em dias de calmaria, fala de uma vida branda, “Acordo e leio o jornal, fico com o rádio ligado e vou vivendo em paz. Ninguém me incomoda, sabe? de vez em quando viajo para ver meus filhos, meus netos, mas gosto mesmo de ficar tranquila”, conta a devota orgulhosa e agradecida de Santo Antônio.
Com muito custo, lembra da maior tristeza: quando sua casa foi alagada pela enchente de 41. “Perdemos tudo, tudo, tudo. Lembro de ver a água subindo e erguendo os vidros da cristaleira. Do final da tarde para a noite, entrou um metro e meio de água dentro de casa”. Com os filhos pequenos, ela e o marido contrairam pneumonia.
Os dois se conheceram quando Erika tinha 15 anos, e casaram-se 12 meses depois. Ela, filha de um bem sucedido caixeiro viajante alemão e uma talentosa professora de inúmeros instrumentos musicais, de Santa Cruz. Ele, filho do romano Henrique Caetani, descendente da estirpe do papa Benedito Caetani, que criou o Ano Santo e uma francesa.
Erika e o marido encontraram-se na esquina de casa, por intermédio de uma amiga em comum e aluna da mãe de Érica. O namoro de janela e portão, escondido, passou para a sala de casa e foi aceito. “Fui muito feliz com ele”, lembra. Na construção da família, aceitou o pedido do marido para que não estudasse mais e desistiu do curso de enfermagem, mas construiu a meta de formar os filhos. “Tivemos nossas dificuldades para conseguir, mas deu certo, e eles cumpriram com a promessa de não casar antes de se formarem na universidade”.
Da mãe, ela guarda outro ensinamento: o tocar piano, habilidade que a matriarca aprendeu no internato, para onde foi mandada depois que a avó de Erika morreu de tombo de cavalo. Era parteira e uma criança estava a nascer. Érica, por sua vez, não foi enfermeira, mas tem cinco médicos formados entre filhos e netos.
** Dona Érika uma vez se escondeu num aniversário na casa da sobrinha. Foi denunciada por ela.
* Quando a mãe permitiu o namoro, disse assim: “diga a ele que não se namora no portão e janela. Que entre, que por isso não estará firmando compromisso de casamento, mas preciso conhecê-lo – uma coisa rara daquele tempo”.
[primeiro de maio. foto de tarsila pereira. ]