
Estupro é arma de guerra na Africa
Com a aniquilação dos moradores, os agressores exploram mais facilmente a região rica em minerais como a cassiterita
A violência sexual contra mulheres da República Democrática do Congo aumentou nos últimos dez anos – 18% dos casos da década são de 2009. “Estão destruindo a humanidade ali e ninguém faz nada”, alertou o ginecologista Denis Mukwege, fundador em 1999 do Hospital de Panzi, que atende vítimas de abuso. Ele ministrou ontem em Porto Alegre palestra ligada ao Fronteiras do Pensamento, quando explicou que a guerra no país é econômica e clamou por intervenção internacional. “A ajuda humanitária é assistencialista, não resolve a origem do problema.”
Ao menos um terço dos casos que atende é de mulheres torturadas a ponto de necessitarem de cirurgias. “Intensificam-se os casos em que elas perdem não só o aparelho genital, mas também a bexiga e até mesmo o aparelho digestivo.”
O médico, indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2009, concedido a Barack Obama, disse que não é uma luta entre grupos étnicos nem guerra entre países. “Há 15 anos houve intensos genocídios em Ruanda. Os ”genocidários” vieram se refugiar na República Democrática do Congo e utilizam as mulheres como arma de guerra. A destruição psicológica e emocional em uma mulher violentada na comunidade faz com que os moradores queiram fugir.” Conforme Mukwege, pela humilhação e pela violência, destroem famílias. “Com a aniquilação dos moradores, exploram mais facilmente a região rica em materiais utilizados em componentes eletrônicos, como a cassiterita. Há empresas multinacionais que extraem os minérios na África.”
Os agressores entendem que quanto maior e mais evidente o dano, mais eficaz. “Atiram na genitália, inserem baionetas, pedaços de pau, deixando suas marcas. Querem traumatizar ao máximo e não há distinção de idade; atingem de crianças a idosas.” Mukwege esclareceu que a violência sexual ocorre em outros países como Congo, Bósnia, Colômbia ou Quirguistão, onde crianças são violentadas na frente dos pais.
O médico comentou que as mulheres tentam esconder as agressões, sua primeira reação é proteger a dignidade. “Mas, se não conseguem mais controlar as fezes e ferimentos, não há como esconder”, disse. As vítimas chegam ao hospital sozinhas ou encaminhadas por associações. Também há equipes móveis de médicos. “Não temos capacidade de atender mais de dez mulheres por dia e só recebemos os casos mais graves, mas eles vêm aumentando. Ano passado foram atendidos 5,5 mil casos e em dez anos, 30 mil mulheres”, mensurou.
[foto camila domingues. junho de 2010]

