
Geoparques – Uma aventura ao alcance de todos
As atividades ao ar livre, coração do ecoturismo, podem ser muito mais enriquecidas com conhecimentos científicos e históricos da geologia. Uma ciência que pode nos trazer de volta mundos esquecidos, futuros apagados. Essa realidade já está acontecendo no Brasil e ganhando força nos últimos anos, com a criação de novos Geoparques no país
Conhecer um Brasil mais antigo que os dinossauros, com rochas formadas muito antes do nascimento da Pangeia. Escalar, pedalar, caminhar por lugares que já foram rios, mares, oceanos. Martelar uma rocha e encontrar o fóssil de um animal que viveu e morreu há milênios de anos e naquele lugar, por um instante, ver os tempos de vida presente e ancestral do universo se encontrarem. Começar a conhecer as dinâmicas dos ventos, fogo, água, a dinâmica de nossa Terra. Sentir na pele que o tempo aqui é infinito e tudo transformação permanente, histórias, mistérios.
A diretora executiva do Consórcio Público Intermunicipal Geoparque Seridó, Janaína Luciana de Medeiros, destaca que um Geoparque permite que “possamos conversar com o nosso patrimônio geológico em prol do conhecimento que esse patrimônio geológico nos traz em relação à história geológica de formação da nossa casa mãe, o nosso planeta Terra”. Formada e mestre em turismo, com inúmeras especializações e CEO da GS EXPERIENCE, Janaína também é autora do projeto de educação turística “Os cinco sentidos do Geoparque Seridó/RN: Geodiversidade, Geopatrimônio, Geoconservação, Geoeducação, Geo-turismo”.
Geoparques no mundo
A história da formação de geoparques no mundo é recente. André Borba, Geólogo, mestre e doutor em Geociências, professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e coordenador científico do Caçapava Geoparque Mundial da UNESCO, explica que pouco antes dos anos 2000, alguns geocientistas europeus, principalmente da Grécia, Espanha, França e Alemanha, perceberam que os territórios importantes para a geologia estavam experimentando altas taxas de envelhecimento da população, êxodo rural, empobrecimento, ou degradação ambiental.
Geralmente estavam localizados em terrenos pedregosos, com muita exposição de rochas e áreas de fraca economia local, com baixos Índices de Desenvolvimento Humano(IDH). Na busca por alternativas, desenvolveu-se a ideia de Geoparques: territórios com importantes características de geologia, presença de fósseis, formas de relevo únicas e ou mais especificidades internacionalmente relevantes na área. A partir deste território e de seu patrimônio, elabora-se uma estratégia de desenvolvimento local para fazer com que essas características de geologia trabalhem a favor da população local.
“Não da maneira tradicional com os territórios fornecendo recursos minerais e tendo pouco retorno em desenvolvimento social e humano. Mas sim através, principalmente, do turismo sustentável, de conhecimento, descobertas, lugares históricos e inexplorados, com ambientes e públicos muito atrelados ao turismo de aventura, inclusive”, aponta Borba.
O relevo com vertentes mais íngremes, característico de muitos Geoparques, também apresenta vantagens: é perfeito para atividades de aventura como escalada, rapel, trekking, canionismo, hiking, cicloturismo, ou caminhadas até cachoeiras ou por cânion.
Geoparques no Brasil
No Brasil, o primeiro Geoparque a ser reconhecido foi o do Araripe, localizado no Sul do Ceará, onde há fósseis de peixes, pterossauros, insetos e outros grupos de animais da era Mesozoica. Por muitos anos ficou sendo o único do Brasil, até que, aos poucos, as equipes interessadas de outras regiões do país começassem a construir seus próprios projetos. “Iniciativas de desenvolvimento local, com envolvimento público, científico e uma comunidade de IDH baixo é uma coisa que demora bastante. Agora que as sociedades estão absorvendo essa nova abordagem de território. Nos últimos dois anos tivemos quatro novos geoparques certificados pela UNESCO no Brasil, e em breve poderemos ter a confirmação do geoparque de Uberaba, em Minas Gerais.”
Em Caçapava do Sul, um dos mais recentes geoparques brasileiros reconhecidos, são 3 mil quilômetros quadrados com uma natureza perfeita para esportes de aventura, com destaque para a escalada em arenitos e conglomerados. A regulamentação oficial se deu em reunião da Unesco em maio de 2023, e o certificado foi recebido em meio aos efeitos do terremoto de Marrocos em setembro deste mesmo ano.
Borba explica que no Caçapava Geoparque Mundial da UNESCO a idade geológica remete a 600 e 500 milhões de anos de idade. Na chamada Bacia do Camaquã existem rochas sedimentares e vulcânicas que materializam a fase de transição da plataforma Sul-Americana, na época do continente Gondwana, anterior à Pangeia (300 milhões de anos). A América do Sul, portanto, fez parte do Gondwana. “Existem outras exposições deste período em Santa Catarina, Paraná, Índia e África, mas o material mais rico do mundo para estudos sobre aquele momento e evolução do continente Gondwana está em Caçapava”, diz Borba.
Na região existem morros de conglomerados que formam uma das principais regiões gaúchas para a prática da escalada, com centenas de vias já conquistadas. As agarras são o diferencial para os escaladores. São formadas por seixos que eram os pedregulhos de antigos rios que passaram por ali há mais de 500 milhões de anos. Localizados a 300 metros acima do nível do mar, os morros possuem até 120 metros de altura.
Crescimento de grandes e pequenas empresas
No quesito desenvolvimento social sustentável, está sendo adotado um sistema de redes de parceiros que promovam a qualificação e visibilidade turística local. “Há também a oportunidade de venda de artesanatos de produtos como lã de cordeiros, a valorização de produtos locais como laranjas, bergamotas, pitaias. Já existe um grupo forte de artesãs, principalmente mulheres, que está se fortalecendo com produtos alusivos às Guaritas, Pedra do Segredo, rochas, flores, cactos. Essa rede de parceiros reúne tanto pessoas individuais como associações até grandes empresários. Temos aqui rótulos que estão entre os melhores azeites de oliva do mundo. Estamos na segunda edição da Festa do Azeite de Oliva. Desde o pequeno agricultor ou artesão, hospedagem, alimentação e agências de turismo de aventura, até o grande empresário, com produtos internacionalmente reconhecidos, todos cabem nessa cadeia de produção e desenvolvimento”, conta André Borba.
No Geoparque Global Seridó da UNESCO, além do projeto de turismo e educação, a Quinta da Serra, produtora de ovos caipiras, em 2023, se tornou a primeira empresa brasileira parceira GEOfood, uma iniciativa para comunidades e empresas de alimentos ecologicamente corretas inseridas nos Geoparques UNESCO.
Em Caçapava do Sul está sendo criado o Caminho da Geodiversidade Gaúcha, um circuito turístico com saída e chegada em Caçapava do Sul e que vai integrar a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso. Atualmente existe a necessidade de qualificação do setor, com a formação de mais guias de turismo, fortalecimento de agências e operadoras, e parcerias diversas para divulgação turística.
Outra próxima conquista será criar o Centro de Atendimento ao Visitante com informações geoturísticas e orientações de atendimentos e atividades, uma das demandas apontadas pela UNESCO. A cada quatro anos a organização mundial reavalia cada Geoparque e renova ou não a permanência dele no panorama mundial de geociências e turismo.
por Leda Malysz, veja mais informações sobre cada Geoparque em arte na revista postada acima. Conteúdo de agosto de 2023, o número de Geoparques citado no texto já pode ter sido superado no momento de sua leitura. *matéria publicada na edição digital da revista Abeta Summitt 2023, publicação Abeta edição Broto de Letra.


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