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Literatura que conta

Florianópolis. Festival Nacional do Conto Reúne a partir de hoje autores reconhecidos e jovens talentos do gênero


Novos e consagrados escritores se reúnem a partir desta terça-feira em Florianópolis para o Festival Nacional de Contos, que propõe o debate e fomento do gênero de maneira única na America Latina, além de uma aproximação maior entre leitores e escritores durante cinco dias. Criado em Jaraguá do Sul, em sua terceira edição, essa é a primeira vez que o Festival ocorre na Capital, e pela primeira vez será transmitido ao vivo, pelo site do SESC-SC.
Na abertura, hoje, às 20h, no Teatro do Sesc Florianópolis, o convidado de honra Luiz Vilela fará a leitura de um dos contos de “Era Aqui”, livro previsto para sair ainda no primeiro semestre deste ano pela Record. “Uma oportunidade única de presenciar uma criação tão recente pela voz do próprio autor, sendo ele um cânone do gênero, comparado a Rubem Fonseca e Dalton Trevisan”, destaca o idealizador e organizador do evento, além de contista, Carlos Henrique Schroeder. A noite segue com o diálogo sobre as fronteiras do conto com a curitibana Luci Collin, autora de “Precioso Impreciso” e “Inescritos”. A presença de escritores reconhecidos ao lado de novos talentosos e não muito conhecidos autores é uma marca do evento, segundo Schroeder. Estarão presentes três autores integrantes da mais recente lista dos melhores jovens autores brasileiros da revista de literatura Granta: Antônio Xerxenesky, Leandro Sarmatz e Julián Fuks.  “A proposta é fazermos uma salada de estilos literários e experiências, para irmos desenvolvendo um panorama do conto no Brasil”, afirma ele, que completa: “O livro continua sendo a mídia ideal do conto. Na internet, ele pode ser mais abundante, mas se perde naquela massaroca líquida, não há filtro”, afirma.
Um gênero rechaçado pelo mercado, com editoras que preferem lançar romances e novelas e garantir as vendas, o conto busca seu espaço “que na verdade sempre existiu. Podem existir modas, mas a grande literatura permanece”, diz Schoreder. Ele destaca que o costume de leitores preferir novelas foi imposto pelo próprio mercado editorial, que aposta na edição do conto apenas para crianças e adolescentes. “O conto remete a pequenas histórias, que são a base de nosso aprendizado por toda vida. À graça de ouvir, ler, contar histórias. Em algum momento existe esse desligamento, e o adulto se perde do conto, mas ele está aí”. O evento é uma realização do Sesc e da Design Editora, com apoio da Editora UFSC. 
Programação com debates e discussões. Sábado tem show e oficina
Após a abertura hoje, a programação segue na quarta-feira com um bate-papo entre Marcelo Moutinho, Antônio Xerxenesky e Ronaldo Bressane, tão diferentes em suas formas de escrita, sobre a “A diversidade no conto brasileiro contemporâneo”.  A noite de quinta reserva uma discussão sobre a relação entre o peso da tradição e os ares contemporâneos na escrita de contos, com odescendente de imigrantes judeus Leandro Sarmatz e o paulista e filho de argentinos Julián Fuks. Numa homenagem a Silveira de Souza, um dos grandes contistas catarinenses, autor de “Ecos no porão – Volumes I e II”, “Relatos escolhidos” e “Janela de Varrer”, o diretor da editora da UFSC Sérgio Medeiros media conversa com o autor na noite de sexta-feira. A programação se encerra sábado a noite com o show “Já Tive uns Ataques, vou Ter Mais uma Síncope” e lançamento do EP homônimo, com Luiz Felipe Leprevost. O evento promove apenas uma oficina, de criação literária, com João Silvério Trevisan, detentor de três  Jabutis, com “Ana em Veneza”, “Troços & Destroços”, “O Livro do Avesso” e do prêmio APCA com “O rei do cheiro”. A oficina ocorre sexta-feira das 19h às 22h e sábado das 16h às 19h. Incrições até hoje pelo email patriciagaleli@sesc-sc.com.br. Os eventos começam diariamente às 20h.
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Escritor Silveira de Souza é homenageado na sexta-feira



O encanto do econômico e significativo
A maneira como os contos, textos estruturados de forma tão sintética e escrita econômica conseguem produzir efeitos tão impressionantes durante a leitura foi algo que sempre encantou Silveira de Souza, um dos ícones do gênero no Estado, que será homenageado na sexta-feira. Sua relação com os contos começou em casa, na época de infância, quando seus pais reuniam a família para a roda de leitura do final do dia. Foi por essas vozes que ele conheceu Machado de Assis, Monteiro Lobato e Eça de Queiroz. Pouco tempo depois, se apaixonou pelo russo Anton Pavlovitch e seguiu leituras de Jorge Luiz Borges, Guimarães Roca, Clarice Lispector e Julio Cortázar.
O poder sintético do conto faz o autor o aproximar da poesia, e pelo motivo, o encara como algo mais difícil que o romance. Desde seus primeiros escritos, o autor elabora estruturas de linguagem para clarear imagens ao leitor. Na linha de conto que ele pratica, um personagem, talvez anônimo, vive um acontecimento crucial em sua vida.  Um acontecido que impressiona Souza a ponto de ele re-significar aquilo e transmitir às letras “Mas é difícil falar sobre, porque no momento da escrita, surgem coisas antes não imaginadas”, conta o autor, que até hoje pensa a criação literária como espécie de sofrimento mental. Atualmente, pela primeira vez, ele se dedica a uma escrita mais longa. Não chega a romance, avisa, “talvez uma novela”.
Antônio Xerxenesky, Marcelo Moutinho e Ronaldo Bressan falam sobre diversidade do conto na quarta-feira

Liberdade narrativa ao conto


O conto contemporâneo não participa de definições que ele detinha em outros tempos, quando a ideia do gênero era distinta entre os século 18, 19 e 20, seguindo a influência de movimentos literários de cada época, seja romantismo ou realismo, segundo a avaliação de Antônio Xerxenesky, que conversa sobre a diversidade no conto brasileiro contemporâneo com Marcelo Moutinho e Ronaldo Bressane na quarta-feira. “Hoje há espaços para todos, e essas definições não encontram mais motivos de ser. O conto, hoje, é um texto curto”, opina ele que se dedica a uma obra como ele mesmo define, mais de entretenimento, cheia de metalinguagem, em ambientes de terror ou ficção cientifícia por exemplo.

Mesmo assim, ele concorda que as pequenas editoras têm investido em obras com conteúdo mais fantástico e “pulp”. “Mas isso é coisa de momento, e do Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, os contos do NYT, que ditam a tendência americana, seguem com a forma narrativa realista, eles são ótimos nisso”, relata.
Xerxenesky estará na mesa justamente com autores distintos: Bressane, que se dedica a histórias científicas de uma forma mais visceram e Moutinho, carioca que traz contos mais psicológicos, elípticos, com urbanidade e diferença de classes.
Serviço:
O quê: Festival Nacional de Contos – 3ª edição
Quando: De hoje a sábado. Mesas diariamente às 20h, oficina sexta-feira, das 19h até 22h e sábado das 16h até 19h.
Onde: Teatro do Sesc Florianópolis Prainha 
Quanto: Travessa Syriaco Atherino, 100, Centro, Florianópolis, 3229-2200
*Foto de Silveira de Souza por Washington Fidelis. As demais divulgação.